RARIDADE

Com narrativa sobre a pobreza nos EUA, Maid é uma exceção em Hollywood

Minissérie mostra realidade vivida por 49 milhões de americanos beneficiários de programa social contra a fome

Publicado em 08/10/2021

Na minissérie Maid, a faxineira Alex (Margaret Qualley) sofre para receber assistências governamentais, como o programa contra a fome chamado de Snap. O que o drama da Netflix, baseado em uma história verídica, retrata é uma realidade vivida por cerca de 49 milhões de norte-americanos dependentes desse benefício, porém esquecidos nas produções hollywoodianas majoritariamente cegas à parcela do povo inserido na pobreza.

Em geral, a miséria nos Estados Unidos é raramente abordada nas produções de entretenimento, uma impressão passada ao público médio de que em um país considerado de primeiro mundo não há pobres, nem pessoas sem casa ou sem uma renda mínima para o pão de cada dia.

Por isso Maid, além de entreter, presta um baita serviço ao documentar como é complicado viver na pobreza nos EUA.

Na maioria das vezes, dramas não abordam esse assunto. As comédias são mais abertas ao tema. Mas justamente por causa do gênero, há um tratamento mais cômico em relação ao sofrimento de quem não tem dinheiro dentro da sociedade símbolo do capitalismo.

O desconto é maior se você não comprar

O brasileiro é familiarizado com uma série americana que trata da pobreza com genialidade. É o caso de Todo Mundo Odeia o Chris (2005-2009; Globoplay), sobre uma família carente cujo patriarca Julius, o pai do pãodurismo, precisava trabalhar em dois empregos para sustentar a família. Ele eternizou frases inspiradoras maravilhosas sobre economizar dinheiro, como a clássica: “se eu não comprar nada, o desconto é maior.”

Muitas comédias narraram a rotina de famílias operárias, de classe média baixa. O maior exemplo desse filão foi The Middle (2009-2018), com o “meio” até no nome. O enredo destacava as adversidades de precisar juntar dinheiro no pagamento de contas, deixar de comprar uma coisa e adquirir outra e usar os produtos até a data (ou depois do) vencimento.

Em algumas séries, a jornada da pobreza esteve encoberta pela trama maior, como em The Big Bang Theory (2007-2019; HBO Max). Penny (Kaley Cuoco) foi o símbolo da farsa do Sonho Americano. Ela largou o interior dos EUA pelo desejo de ser atriz em Hollywood. Só fracassou, trabalhou como garçonete e não conseguia quitar as contas do apartamento. Roubava o wifi dos vizinhos e jantava com eles sem pagar pela comida. 

Apartamento de Penny (Kaley Cuoco) sem luz; ela não tinha dinheiro para pagar a conta
Apartamento de Penny (Kaley Cuoco) sem luz; ela não tinha dinheiro para pagar a conta (Reprodução/CBS)

Poucos exemplos

A lista de comédias com o tema da miséria nas narrativas é muito extensa. Acima, foram só alguns exemplos. Entre os dramas, essa abordagem é mais escassa. Contudo quando ocorre, deixa uma marca.

The Wire (2002-2008; HBO Max) foi a série que melhor representou o quanto a pobreza está conectada com a vida criminal, isso sem fazer sensacionalismo ou panfletagem gratuita.

Com a personagem Cindy (Adrienne C. Moore), Orange Is the New Black (2013-2019; Netflix) mostrou em alguns episódios a rotina de pessoas sem-teto, mesmo aquelas com um trabalho durante o dia. A vida de pessoas sem moradia é abordada na atual segunda temporada de Truth Be Told (Apple TV+). 

Alex (Margaret Qualley) "vê" o dinheiro sumir em Maid
Alex (Margaret Qualley) “vê” o dinheiro sumir em Maid – (Reprodução/Netflix)

A realidade visceral de Maid

Maid faz questão de sempre deixar claro ao telespectador um fato: Alex é pobre. É aplicado um recurso interessante nessa finalidade. Na tela, aparece o montante de dinheiro que a faxineira tem e o que ele vai perdendo conforme gasta, seja abastecendo o carro ou em uma compra no mercado. 

Em certo momento, ela teve de escolher entre o lanche do café da manhã ou um produto de limpeza. Ficou com a segunda opção, não se alimentou e desmaiou no trabalho.

O que Maid tem de principal diferencial é expor ao mundo todo a burocracia do assistencialismo social americano. Como bem definiu a própria Alex, uma mãe solo sem-teto e sem dinheiro: “Eu preciso de um emprego para provar que preciso de creche para [daí] eu ter tempo para arrumar emprego… Que babaquice é essa?

A pobreza nos EUA pode não ter tão grave como em países subdesenvolvidos, mas existe e é um problema. Nos últimos anos, a renda média da população diminuiu e a miséria cresceu. De acordo com o Censo americano, 37,2 milhões de pessoas vivem na pobreza. Maid deixa um registro em Hollywood de como é (um pouco) o dia a dia delas.


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